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Opinião: Lançamento de Riftbound falhou com o Brasil

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Boxes inflacionadas, ausência de Proving Grounds e incerteza até o último dia se os eventos de lançamento ocorreriam nas datas combinadas: uma mistura perfeita que mostrou como a baixa produção e erros de distribuição de Riftbound falharam com o maior consumidor de TCGs da América Latina.

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revisado por Tabata Marques

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No momento em que este artigo vai ao ar, acontece no Brasil o lançamento oficial de Riftbound, o card game baseado no universo de League of Legends.

Era esperado que um título dessa magnitude chegasse ao mercado com força. Afinal, Riftbound carrega a marca de um dos jogos mais influentes do mundo e vinha cercado por um interesse crescente, alimentado pela busca por um TCG que combinasse boa jogabilidade, apelo visual e segurança para quem pretende investir em decks, competir e até sonhar com um palco mundial — algo que faz parte do imaginário de praticamente todo jogador de card game.

Com um preço sugerido abaixo de concorrentes tradicionais e um formato que integra modos competitivos solo e multiplayer desde o primeiro dia, muitos apostavam em um dos lançamentos mais marcantes dos últimos anos. Havia um terreno fértil, tanto para a comunidade de TCGs quanto para o público de League of Legends, que raramente recebe produtos colecionáveis acessíveis no Brasil.

Memorável, Riftbound até é — mas por razões que deveriam ter sido evitadas.

A Riot e a UVS Games subestimaram a demanda global do próprio produto, e os efeitos disso foram sentidos em praticamente todas as regiões: atrasos generalizados, quantidades reduzidas enviadas às lojas, datas de lançamento quebradas e remarcadas e, no caso do Brasil, uma estreia que acontece quase um mês após o previsto.

Soma-se a isso os problemas logísticos envolvendo preorders internacionais no site da Riot ainda não entregues a vários consumidores, falhas na qualidade de impressão, distribuição irregular de raridades nos boosters e silêncio sobre novas levas do Proving Grounds, o conjunto com quatro decks prontos que serviria como porta de entrada ideal para novos jogadores.

Proving Grounds, inclusive, é o principal motivador deste artigo.

O caso de Riftbound no Brasil

Chamar o lançamento brasileiro de conturbado beira o eufemismo. As primeiras sinalizações de que a distribuição seria problemática surgiram quando lojas dos Estados Unidos e Canadá começaram a relatar atrasos, remessas incompletas e pedidos reduzidos às vésperas da pré-venda nacional.

Em um dos nossos vídeos, apontamos os principais riscos:

- Baixa disponibilidade de produtos para o Brasil caso este seja considerado “mercado secundário”, uma possibilidade vista os recentes movimentos de outras empresas, como a Wizards of the Coast, em relação ao país.

- Aumento de preços de produtos baseados em especulação, scalping e alta demanda com pouca oferta, que poderia afastar o consumidor de card game, pois estes valores estão competindo com outros produtos do segmento, enquanto afastaria o fã de League of Legends pela natureza free to play do MOBA.

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Esses alertas também tinham preocupações com o cenário regional: o público brasileiro de League of Legends é gigantesco e há anos demonstra carência por produtos colecionáveis licenciados pela Riot. Para uma parte considerável deles, Riftbound seria a chance de ter em mãos algo físico, colecionável, e ligado diretamente ao universo dos campeões que acompanham há uma década. Junte essa expectativa ao apetite natural da comunidade de TCGs e havia um cenário claro de demanda muito acima da média.

O primeiro obstáculo, no entanto, surgiu antes de o jogo chegar às lojas: uma booster box de Riftbound chegou à pré-venda por cerca de R$ 1.300, vinda da distribuidora — o equivalente a US$ 243 ou € 211. Visando suas margens de lucro, as lojas repassaram o produto com preços médios de R$ 1.600 para uma box de Origins, valor muito superior ao que a comunidade esperava ao considerar o preço sugerido dele no exterior.

Para comparação, Riftbound chegou ao Brasil custando mais do que uma booster box de Magic: The Gathering x Final Fantasy no lançamento, expansão premium e recordista de vendas da franquia, apesar do MSRP internacional ser muito menor: € 127,99 (algo em torno de US$ 147 ou R$ 787), enquanto a box de Final Fantasy tinha MSRP de US$ 210.

O que nunca ficou claro, por nenhuma parte, é como um produto com MSRP consideravelmente mais baixo chegou ao consumidor brasileiro com um preço tão elevado e comparável com o produto que gerou mais hype na comunidade de card games no ano. Lojas não obtiveram respostas da UVS Games sobre a formação dos valores e, para quem compra, ficou a sensação desconfortável de estar pagando preços de scalper ainda no varejo oficial.

Indignação não faltou, mas reclamações e xingamentos em comentários de YouTube e nas mídias sociais não vão muito longe. Faltaram ações coordenadas do público, transparência da distribuidora e da fabricante e qualquer iniciativa concreta até o momento para tornar Riftbound mais acessível.

Enquanto isso, a velha lógica do “ao invés” — muito presente no consumidor brasileiro de card games — voltou à mesa: se o custo de Riftbound é igual ou maior ao de um TCG já consolidado, por qual motivo um jogador trocaria segurança por incerteza? E isso vale para todos os aspectos: o custo de singles, facilidade de montar decks, estrutura competitiva, espaço no calendário das lojas. No final, Riftbound entrou em disputa direta com todos os outros card games do país, e o fez com a desvantagem do preço e da incerteza.

Para outra comparação, Flesh and Blood, card game da Legend Story Studios, chegou ao Brasil em 2022 com preços mais acessíveis, e apesar da baixa disponibilidade de singles em seu primeiro ano ter inflado consideravelmente os custos para montar um deck, o jogo sucedeu no país, capturou fãs fiéis de diversos outros TCGs, e hoje tem uma das comunidades mais aguerridas em consumir o produto, participar dos eventos semanais e dos grandes torneios competitivos no país, e o Brasil se mantém como uma força a ser considerada e respeitada no cenário mundial — e nada seria possível se o título não tivesse dado os passos certos nos primeiros três meses no país.

A comunidade de Riftbound, no entanto, decidiu dar seu voto de fé. Grupos cresceram, discussões se intensificaram e a expectativa se manteve viva até que, três dias antes do lançamento oficial, veio o golpe mais duro: Proving Grounds não viria para a maioria.

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Em e-mail enviado a diversas lojas, a distribuidora oficial informou que muitas unidades de Proving Grounds não seriam entregues devido a um erro de estoque. Não houve explicação detalhada, nem indicação de medidas futuras para corrigir a situação de nenhum dos elos da escala de produção e distribuição.

Proving Grounds, vale lembrar, era o produto ideal para apresentar Riftbound ao público: quatro decks equilibrados, prontos para jogar, com excelente custo-benefício e pensado justamente para iniciantes e grupos de amigos. Era o tipo de lançamento que impulsiona comunidade, eventos e novas vendas, o produto ideal para ter na sua vitrine como um convite de “venha jogar Riftbound!” — e ele desapareceu. Lojas que já haviam esgotado suas pré-vendas — com poucas unidades disponíveis na própria distribuidora, cerca de quatro por loja — foram obrigadas a avisar clientes de que o produto não chegaria e seus pedidos foram cancelados.

A confiança, que já estava estremecida, se partiu: consumidores perderam a segurança de que receberiam seus pedidos, lojistas perderam a capacidade de garantir qualquer previsibilidade ao cliente, e a narrativa de “Riftbound pode ser o melhor card game da atualidade” se transformou em “Riftbound já vai nascer morto no Brasil”.

Se a intenção era celebrar Riftbound e o universo de League of Legends em território nacional, Origins entra para a história como um dos lançamentos mais problemáticos do setor no Brasil, e o estrago na relação entre comunidade, lojas, distribuidora e marca, somado com a frustração e raiva do público consumidor, trará severas dificuldades em construir e desenvolver uma comunidade saudável no país.

É lamentável, para não dizer vergonhoso, do início ao fim.

Como resolver este problema?

Dizer “foi lamentável” também só chega até um certo ponto. A realidade é que o lançamento de Riftbound está sendo turbulento no mundo inteiro, e isso inclusive serve como uma das justificativas comuns para “não desistir do jogo ainda” para uma parte do seu público.

No entanto, o caso do Brasil não é menos grave que o de qualquer outro país que esteja enfrentando problemas logísticos, e nos cabe avaliar quais soluções podem ser adotadas para mitigar o problema na região.

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Algumas, obviamente, passam por coisas que afetam a escala global inteira: ampliar a escala de produção, comunicação mais clara, evitar que os erros do Proving Grounds se repitam em produtos de introdução futuros, mas outros demandam olhar pontualmente para os desafios da América Latina — maior suporte regional para acessibilidade e busca de novas parcerias para distribuição no Brasil.

Ampliar consideravelmente a escala de produção

Riftbound estreou com um nível de expectativa absurdo, e a combinação de um público tradicional de TCGs e uma comunidade gigantesca de League of Legends criou uma demanda que não poderia ter sido tratada com descaso. O jogo nasceu grande, talvez maior do que qualquer projeção inicial, e exigir que essa estrutura funcione com uma tiragem tão limitada é ignorar a realidade que estava posta meses antes do lançamento, quando o jogo ainda se chamava Project K.

Não foi produzido material o suficiente: as lojas receberam poucas unidades de Origins, o Proving Grounds praticamente não chegou ao país e, mesmo com o comunicado recente da UVS/Riot prometendo ajustes na distribuição — incluindo cards do Proving Grounds em pacotes de Nexus Night e uma ampliação gradual da produção —, o estrago ainda está muito longe de ser revertido.

Dadas as circunstâncias que não afetam isoladamente o Brasil, mas diversos outros países, é necessário restabelecer a confiança: se Spiritforged, previsto para fevereiro de 2026, repetir os mesmos erros, ou se Origins permanecer um produto difícil de encontrar pelos próximos meses, a percepção do público será de que o jogo não é capaz de sustentar seu próprio crescimento e, portanto, os preços ficarão ainda mais inflacionados e dificultarão a acessibilidade, ponto essencial para um desenvolvimento saudável no longo prazo.

Em condições ideais, Origins precisa de uma tiragem ampliada por muito tempo, com uma reposição robusta. É a única forma de estabilizar preços, normalizar o acesso das lojas, fortalecer o competitivo e devolver ao consumidor a sensação de que o jogo está evoluindo ao invés de afundando em problemas de logística.

Admitir o erro e fazer por onde Proving Grounds ser um produto disponível e acessível

O Proving Grounds nasceu para ser a porta de entrada e deveria cumprir o papel de introduzir novos jogadores e servir como ponte entre o público de League of Legends e o cenário tradicional de card games. Ao incluir campeões e cards exclusivos que não existem em nenhum outro produto, o item deixou de ser uma ferramenta de onboarding e se transformou em um produto de luxo, e se tornou ainda mais problemático porque Master Yi — hoje um dos decks mais fortes do Metagame competitivo — está restrito a esse item.

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O cenário de baixa oferta e alta procura abriu espaço para scalping, preços abusivos e distorções competitivas que poderiam ter sido evitadas com uma estrutura de distribuição mais equilibrada. A nota oficial não menciona nenhuma nova leva de Proving Grounds, e existe a possibilidade de o produto ser mais caro ou demorado de fabricar que uma booster box comum e, portanto, não terá uma segunda leva no futuro próximo e que cortes na distribuição do mesmo seriam inevitáveis, apenas aconteceu de o Brasil estar na linha.

Neste ponto, é preciso admitir o erro e garantir uma nova produção do Proving Grounds — com disponibilidade real para todas as regiões — para reparar a relação com o público. Além disso, uma caixa promocional não deve mais carregar conteúdo essencial ao Metagame de maneira exclusiva e inacessível por outros meios ou produtos.

Dar mais ênfase ao suporte regional

O Brasil é um dos públicos mais vocais de League of Legends e um consumidor estabelecido de card games. Se o objetivo é construir Riftbound como um TCG sólido e presente em diversos países, o suporte regional precisa ser tratado como parte fundamental do crescimento de longo prazo.

Para Riftbound ter vida longa no país, é preciso presença, comunicação e atenção às particularidades do mercado, com um acompanhamento mais rígido do preço sugerido, aliado a uma política clara de distribuição, que ajudaria a impedir distorções e a construir uma relação mais equilibrada entre fabricante, distribuidora e consumidor.

Isso começa com calendário, torneios e classificatórios acessíveis, mas também envolve dar condições reais para que o competitivo se desenvolva sem depender de escassez ou sorte, afinal, não adianta fomentar o competitivo se o jogador não consegue sequer comprar um deck.

Outro ponto crítico é entender as especificidades de cada região. No Brasil, a maioria das reclamações veio do preço com que as lojas receberam as caixas, que transformou Riftbound em um item distante para boa parte da comunidade de TCGs, pouco disposta a investir tanto quanto em outros jogos sem a mesma confiabilidade e estrutura estabelecida.

Encontrar mais parcerias de distribuição

Os problemas recentes afastaram muitos jogadores que estavam dispostos a investir no jogo. Recuperar essa confiança depende diretamente da capacidade da Riot e da UVS Games de ampliar o leque de parceiros e estabelecer um padrão de entrega que alcance a expectativa criada desde o anúncio do TCG. Além disso, a relação entre a comunidade brasileira e a distribuidora responsável pelo jogo no país ficou, no mínimo, instável — as lojas relatam dificuldade em receber informações claras, o público não vê previsibilidade, e o lançamento, que deveria consolidar confiança, terminou ampliando a distância entre empresa e consumidor.

O primeiro passo é criar uma escala de produção mais sólida, mas o próximo passa por diversificar os canais de importação e distribuição. Trabalhar com apenas uma empresa limita opções e expõe o público a problemas que não deveriam fazer parte da experiência proposta por Riftbound quando o produto chega com falhas, atrasos e preços fora do padrão.

A sucessão de erros faz o consumidor perder a sensação de que há alguém no outro lado garantindo qualidade e mina o engajamento com o produto e conteúdos relacionados desde o primeiro dia. Quando tudo o que falam nas mídias sociais ou grupos de WhatsApp e Discord é que o “jogo vai falhar” ou “nem sequer conseguiram entregar o material”, a percepção coletiva tende a piorar.

Novas parcerias abrem espaço para processos mais eficientes de garantir a entrega e um ambiente onde o mercado pode se ajustar. Quando há mais de uma empresa operando, há também mais responsabilidade e mais competição e, mais importante, o consumidor deixa de ser dependente de uma única estrutura de distribuição que, no momento, não está se mostrando capaz de cumprir com sua parte do contrato comercial com as lojas.

Concluindo

Os desafios, tanto para o Brasil quanto para diversos outros países, continuam grandes, e a percepção coletiva no país, neste momento, é de que a tendência é manter-se assim por muito tempo.

Como mencionado em um artigo anterior, Riftbound tem entre seis meses e um ano para provar seu potencial. Se não conseguir dentro deste prazo, será apenas outro produto cosmético da Riot que deu errado no mercado ocidental, e o primeiro passo para começar a pensar em sucesso de longo prazo é garantir a disponibilidade do produto ao redor do mundo.

Origins falhou, cabe fazer com que Spiritforged e os Sets 3 e 4 não caiam no mesmo abismo. Quem sabe, aí, um jogador não possa olhar para ele e se sentir atraído pela proposta ao invés de intimidado pela insegurança e incerteza de conseguir o produto desejado a cada novo lançamento.

Enquanto essas expectativas são inalcançáveis, não se pode pensar mal sobre quem disser “me chame quando este jogo for capaz de garantir boxes nas lojas e decks para os jogadores”.